Em 2010, quando publica a segunda edição francesa de O riso da Medusa, Hélène Cixous revela no texto de apresentação que já estava rodeada de algumas autoras mulheres quando escreveu o seu ensaio clássico, 35 anos antes, mas que ainda não tinha lido Clarice Lispector. A menção à brasileira não é pouca coisa. A ensaísta se tornou não apenas fã, mas uma das maiores divulgadoras da obra de Clarice na França.
Hélène Cixous só a descobriria em 1976, um ano, portanto, antes da morte da autora, sobre quem escreveu “L’ Heure de Clarice Lispector”, publicado em 1989 na França. No Brasil, a editora Rocco lançou uma edição especial sobre “A hora da estrela” com um outro ensaio de Cixous, que escreveu: “Macabéa não é (senão) uma personagem de ficção. É um grão de poeira que entrou no olho do autor e provocou um mar de lágrimas. Este livro é o mar de lágrimas causado por Macabéa. É também um mar de questões imensas e humildes que não demandam respostas: demandam a vida.”
Num trecho de “A hora da estrela”, o narrador, pelas mãos de Clarice, diz que é não é um intelectual, “escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida”. Escrever com o corpo, pois, foi o que disse Cixous antes de ler Clarice. Não precisamos tentar imaginar o que Cixous sentiu. Ela contou, no trecho final de seu ensaio sobre “A hora da estrela”:
“Assim como Macabéa entrou no olho de Clarice, como um grão de poeira, assim como ela a fez chorar as lágrimas do acreditar, Eu sou tocada pela voz de Clarice.
O passo de sua frase pesada e lenta me pesa no coração, ela caminha a curtas frases pesadas, pensativamente”.