A INSUBMISSA
Cristina Peri Rossi
A insubmissa é o romance de formação autobiográfico de Cristina Peri Rossi, premiada autora uruguaia e uma das mais proeminentes escritoras de língua espanhola. Nele, acompanhamos sua infância e juventude, contadas a partir da estranheza e da perplexidade diante de um mundo sempre em conflito com os seus desejos: usar calças, não comer animais, ter uma biblioteca, escrever, amar outras meninas.
Através de experiências familiares, fabulações e do tempo de um dolorido amadurecimento, se desenha uma personalidade contestadora e determinada a viver os seus desejos mais profundos a despeito das interdições impostas ao comportamento e ao corpo de uma mulher.
Em meio a uma rica produção de ficção, poesia e ensaios, A insubmissa é a obra mais recente e reveladora da escritora, vencedora do prêmio Miguel de Cervantes e reconhecida como a única mulher do chamado boom da literatura latino-americana.
“Eu lia com o deleite indiscriminado de uma viciada e de uma convertida. Minha religião era a literatura.”
Tradução e posfácio Anita Rivera Guerra
oRELHA
Mas um dia, farto dessa invasão permanente da sua biblioteca, meu tio me deteve, quando eu fugia do seu quarto com um livro embaixo do braço, e me perguntou:
― O que você quer ser quando crescer?
― Escritora ― respondi sem hesitação.
Ele fez uma pausa e depois continuou:
― Quantos livros escritos por mulheres tem nessa biblioteca?
― Três ― eu disse. ― Um quarto só seu, de Virginia Woolf, uma antologia de poemas de Alfonsina Storni e outro de poemas de Safo.
― Você leu a biografia delas? ― perguntou.
― Sim ― respondi.
― Você leu como elas morreram?
― Se suicidaram ― eu disse.
― Pois aprenda a lição ― me disse ―: As mulheres não escrevem, e quando escrevem, se suicidam.

Sobre A autorA
Cristina Peri Rossi (1941) é escritora, tradutora e ativista política uruguaia, autora de uma vasta obra que inclui romances, contos, ensaios e poesia. Em 1972 exilou-se na Espanha, onde mora ainda hoje, e durante a ditadura militar que governou o Uruguai, de 1973 a 1985, teve sua obra proibida no país. Seus livros já foram traduzidos para mais de vinte idiomas. Em 2021, recebeu o Prêmio Miguel de Cervantes, a maior honraria das letras espanholas. A insubmissa, lançada em 2020, é a seu romance mais recente.
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